Nos fundos do quintal do meu tio Zeco, próximo ao muro baixo que dividia nossa casa da casa da dona Marta, havia uma área de serviço, um espaço que se tornava palco de nossas brincadeiras. Naquele dia, uma fogueira dominava o cenário. Não me lembro ao certo o porquê de a fogueira estar lá, mas sua presença logo se integrou à imaginação fértil que movia minhas brincadeiras com meu primo Rafael.
Brincávamos de espadas. Minha espada era uma barra de ferro arredondada, brilhante, que eu imaginava ser tão poderosa quanto as das histórias que povoavam minha mente. Movido por um desejo de torná-la ainda mais imponente, decidi introduzi-la no fogo da fogueira. A barra foi mudando de cor, ganhando um tom vermelho vivo que hipnotizava. Sentia como se estivesse forjando uma arma lendária, digna de guerreiros épicos.
Retirei a barra do fogo, a ponta ardendo em um vermelho intenso, e comecei a ensaiar movimentos, manobras que na imaginação eram precisas e impressionantes. No entanto, a prática revelou-se traiçoeira. Um deslize, um giro mal calculado, e a ponta incandescente encontrou a pele da minha panturrilha. O impacto foi imediato.
Senti a dor antes mesmo de perceber o que havia acontecido. A ponta da barra afundou na carne, e vi, horrorizado, minha pele derreter. Escorreu como se fosse um gel, uma gosma quente que revelava o impacto do metal contra a carne. A dor queimava e latejava, mas o que me impressionava ainda mais era a cena diante de mim.
Corri para dentro de casa, gritando de dor. Minha mãe, sempre atenta, veio em meu socorro. A ferida foi tratada, mas deixou sua marca. Uma cicatriz que ainda carrego, um lembrete vívido daquele dia.
A brincadeira ingênua com fogo e aço deixou uma marca não só na minha pele, mas também na minha memória. Aprendi que brincar com fogo não é apenas uma metáfora. Às vezes, as marcas que carregamos no corpo são lembretes permanentes de lições aprendidas na infância.