As idas e vindas da escola Maria Stela de Novaes moldavam-se como um padrão inevitável. Não era um caminho escolhido por mim, mas um destino diário conduzido pela necessidade. Dentre tantos colegas que compartilhavam o trajeto, a Jaque começou a se destacar. Era a terceira série, e nós já nos reuníamos em pequenos “bandos” para ir e voltar da escola. Cada um seguia seu rumo ao final do trajeto, mas até então, caminhávamos juntos, construindo uma rotina que, sem perceber, marcaria a memória.
Chegávamos à minha rua, e enquanto eu descia para a Rua da Vitória, em algumas ocasiões, acompanhava Jaqueline até a entrada da sua casa. Nunca conheci seus pais, mas suas histórias e seu jeito nos levavam a imaginar que ela era rica. Hoje, sei que isso era apenas fruto de nosso imaginário infantil; afinal, não estaria ela, como nós, estudando em uma escola municipal ao lado da maré?
Um dia, comprei um chiclete que vinha com um anel de plástico. Simples e colorido, parecia especial. Ofereci a ela, um gesto singelo, mas que para mim era cheio de significado. Após esse episódio, tudo mudou. Os colegas, talvez por inocência ou inveja, começaram a dizer para Jaqueline que eu queria namorar com ela. A verdade era que nunca havia dito tal coisa, mas no fundo, era impossível negar que eu tinha uma afeição especial por ela. A acusação dos colegas não passou despercebida, e Jaqueline começou a se afastar.
A distância começou pequena, quase imperceptível, mas logo tornou-se um abismo. Cada vez que a via, meu coração acelerava, e eu perdia a coragem de conversar com ela. Quando ela ia embora, já não caminhávamos juntos. Eu, no entanto, seguia a uma distância segura, observando seus passos, tentando reunir coragem para restabelecer a conexão que o chiclete, ironicamente, parecia ter rompido. Mas nunca consegui. Ela se afastou, e eu me afastei também.
Anos depois, em um supermercado Extrabom da Vila Rubim, a vi. Estava com um menino que corria para todos os lados. Pelo que tudo indicava, era filho dela, pois em uma interação com o menino, ouvi quando ela disse: “meu filho…”. Eu olhei para ela, e ela olhou para mim, disfarçadamente. Quando nossos olhos se cruzaram, imediatamente ambos desviaram o olhar, como se tivéssemos assumido silenciosamente que nos conhecíamos, mas sem a coragem de reatar o laço perdido. Seguimos nossos caminhos sem a conexão da palavra.
Tempos mais tarde, algumas vezes no ônibus, a vi novamente. Agora, estava com uniforme, indo e voltando, não mais da escola, mas do trabalho. Dessa vez, ela já não olhava. Fingiu não me reconhecer. O tempo havia transformado aquela menina que um dia fez meu coração acelerar em uma mulher, e o laço que outrora existira dissolveu-se completamente, restando apenas a lembrança.