Executivo: A Imaginação Como Projeção do Futuro

Executivo: A Imaginação Como Projeção do Futuro

Há momentos na infância que parecem insignificantes no instante em que ocorrem, mas, com o passar dos anos, ganham contornos quase proféticos. Lembro-me vividamente de uma tarde no quintal de casa, no bairro Grande Vitória. Um quintal que mais parecia uma pequena chácara, com espaços amplos que alimentavam minhas brincadeiras e onde a imaginação fazia morada. Ali, entre as paredes de alvenaria que seriam, no futuro, parte de uma piscina que nunca veio a existir, um episódio aparentemente simples se tornou uma marca em minha memória.

Naquele dia, eu segurava uma pasta executiva que pertencera ao meu pai. Uma pasta robusta, de couro preto, que ele usava para carregar papéis importantes para a igreja. Por algum motivo, a pasta havia sido descartada, e agora estava em minhas mãos, transformada em parte do meu mundo de brincadeiras. Na companhia de alguns amigos — cujos rostos e nomes o tempo apagou, mas cuja presença ainda sinto —, olhei para aquela pasta com um misto de curiosidade e fascínio.

A brincadeira era séria, como toda brincadeira infantil que, no fundo, carrega o peso de algo mais profundo. Naquele instante, segurei a pasta com firmeza, ergui-a e declarei em voz alta, com toda a solenidade que a minha infância permitia: “Eu sou um executivo.”

A frase saiu quase espontaneamente, mas, ao mesmo tempo, com uma convicção que parecia maior do que eu. Eu nem sabia exatamente o que significava ser um executivo, mas a palavra tinha peso, tinha presença. Soava importante, quase inalcançável, como algo que um dia eu gostaria de ser.

A pasta, que para o meu pai havia cumprido sua função, tornara-se um símbolo de algo maior para mim. Naquele quintal, cercado de areia e sonhos, as paredes inacabadas da piscina formavam o cenário perfeito para minhas ambições inocentes. Era um palco onde a imaginação transformava objetos comuns em instrumentos de futuro.

Hoje, ao revisitar essa lembrança, percebo que a frase que saiu dos lábios de uma criança era mais do que uma brincadeira. Era uma projeção, um vislumbre do desejo de alcançar algo maior, de ocupar um espaço significativo no mundo. Aquele momento não foi apenas uma brincadeira; foi um encontro com uma aspiração.

A pasta executiva, o quintal, os amigos sem rosto, tudo isso era cenário de um tempo em que sonhar era natural, quase uma extensão da respiração. E, naquele dia, a frase ecoou como uma semente plantada no solo fértil da imaginação.

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