A Travessia pelo Invisível: Sonho, Névoa e Revelação

Entrei em meu sonho como quem se entrega ao mistério, cruzando o limiar de uma porta imensa, de madeira envernizada, cujo toque trazia a suavidade do tempo esculpido. Era uma porta antiga e solene, que me chamava a um destino além da compreensão imediata. Do outro lado, uma névoa cinzenta se espraiava, densa e impenetrável, cobrindo o que estava além como um véu sagrado. Por um momento, meus olhos não viram nada — apenas a vastidão difusa do não saber. Mas então, como que respondendo ao próprio silêncio, um vulto passou rapidamente, e o vento, num movimento lento e grave, começou a erguer as cortinas da neblina, revelando, aos poucos, um novo mundo.

A cada sopro do vento, o cenário emergia, e ali estava eu, diante de um universo que parecia se construir no mesmo instante em que o contemplava. Valas profundas e montes elevados, rios serpenteando para o desconhecido e mares que pareciam estender-se até os limites do imaginável. Terra e céu se encontravam numa linha quase sagrada, um horizonte de luzes e sombras, onde o visível e o invisível se entrelaçavam, como se toda a criação estivesse em um eterno processo de nascimento. O silêncio era preenchido por um som profundo e contínuo, que reverberava como uma melodia sem fim, ecoando tanto fora quanto dentro de mim, um ritmo ancestral, uma via dupla que conectava o mundo e o espírito.

Foi então que a percepção me tomou: eu estava dentro de algo muito maior do que a paisagem à minha frente. Era como se eu tivesse adentrado o próprio cerne do ser, uma dimensão que transcende qualquer limite ou definição. Olhei para trás, buscando a porta por onde entrara, mas ela já não estava lá. Tudo agora era unidade, e eu estava imerso, dissolvido nesse vasto território sem fronteiras, onde o começo e o fim pareciam misturar-se, confundindo o tempo e o espaço.

A luz foi lentamente cedendo lugar a uma escuridão densa, uma penumbra profunda onde os sons se convertiam em sussurros, pequenos ecos que dançavam no ar, como segredos antigos que aguardavam ser desvelados. Era como se eu tivesse entrado em uma caverna dentro do próprio sonho, um santuário subterrâneo com labirintos sem fim. A cada passo, um novo sussurro surgia, como uma memória longínqua chamando pelo meu nome, um convite a seguir adiante e perder-me ainda mais, enquanto me aproximava do que parecia ser o coração desse universo interior.

Caminhando em meio às sombras e aos murmúrios, compreendi que a jornada não era para fora, mas para dentro. A porta havia sido apenas o limiar de uma travessia para o próprio âmago do ser. Eu era, ao mesmo tempo, o viajante e o destino, a pergunta e a resposta. Naquele labirinto, cada passo me conduzia mais fundo ao mistério que sou, a um lugar onde formas e significados se dissolvem e se entrelaçam. Ali, perdi a distinção entre sonho e realidade, e o fim parecia apenas o prenúncio de um novo despertar, uma revelação que se desvelava em silêncio e sombra.

Assim, caminhei sem saber para onde, mas com a intuição de que me aproximava de algo essencial. Nesse espaço onírico e inominável, entendi que a verdadeira porta nunca se fecha, que cada travessia é um chamado para redescobrir a vastidão que nos habita. E ali, no escuro sagrado do sonho, encontrei um pedaço de mim, um fragmento eterno, que continua a buscar — a porta que leva ao infinito de ser.

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