O Sonho das Palmeiras e o Templo que Não Foi

O Sonho das Palmeiras e o Templo que Não Foi

Quando morávamos em Pedra dos Búzios, meu pai teve um sonho peculiar. Nele, ele passava por uma estrada ladeada por palmeiras de ambos os lados. A cena era viva, mas seu significado permanecia um mistério. Ele guardou o sonho no coração, sem entender o que Deus queria mostrar. Algum tempo depois, ao marcar com um colega de trabalho uma ida ao sítio de um parente para buscar mangas, o sonho ganhou forma. Ao se aproximar do local, ele se deparou exatamente com a paisagem do sonho. As palmeiras estavam ali, enfileiradas, testemunhas silenciosas de algo que ia além do natural. Meu pai, tomado por um misto de espanto e reverência, entendeu que aquilo era um sinal divino.

Ao chegar ao sítio, ele notou a distância da cidade e as dificuldades enfrentadas pelos poucos moradores dali para frequentar uma igreja. Não havia templos por perto, e a ausência de acesso espiritual era evidente. Durante a visita, o proprietário da terra, sensibilizado pela situação, fez um pedido: que ali fosse estabelecido um ponto de pregação. Mais do que isso, ele doou um terreno, marcando o espaço onde a igreja poderia ser construída. Era um gesto generoso, mas também um chamado, um convite de Deus para que algo maior fosse feito naquele lugar.

No mesmo dia, meu pai e seu colega foram ao depósito de materiais de construção para obter uma estimativa dos custos. Sem compromisso, queriam apenas avaliar o que seria necessário para erguer o templo. Lá, o proprietário do depósito, um homem chamado senhor Nelson, ouviu a história de meu pai. Ao saber do propósito de construir uma igreja, Nelson, membro da Assembleia de Deus de Madureira, emocionou-se. Ele compartilhou que Deus havia falado com ele recentemente, dizendo que alguém chegaria com um pedido semelhante, e que ele deveria doar os materiais necessários. Para surpresa de meu pai, Nelson confirmou que o material seria dado gratuitamente. Era uma segunda confirmação divina.

Naquela época, tínhamos um vizinho chamado seu Francisco, conhecido como Titico, um pedreiro experiente e dedicado. Ele e sua esposa, dona Eni, eram pessoas simples, mas de grande coração. Titico prontamente se dispôs a ajudar na construção do templo. Em todas as folgas de meu pai, que trabalhava em escala na prefeitura de Vitória, eles partiam antes do amanhecer, às cinco da manhã, e só retornavam ao entardecer, às seis da tarde. Juntos, com esforço e dedicação, começaram a erguer o templo em Nova Campo Grande, em Cariacica. Cada tijolo colocado era um testemunho de fé e perseverança.

Quando o templo finalmente ficou pronto, meu pai, na busca de apoio para a inauguração, procurou a CADEESO, organização que coordenava as igrejas da Assembleia de Deus na região. Ele explicou a necessidade de assistência logística, já que o templo ficava distante da Assembleia de Deus mais próxima. Contudo, foi recebido com uma resposta inesperada e desanimadora. O presidente da CADEESO informou que aquele campo pertencia a um de seus amigos e que somente ele poderia autorizar a construção de uma igreja na região. Apesar das tentativas de diálogo, o pastor responsável pela área nunca recebeu meu pai para discutir a situação. Quando finalmente conseguiu uma resposta clara, a autorização foi negada.

Diante do impasse e profundamente entristecido, meu pai tomou a difícil decisão de devolver a propriedade ao doador original. Ele também fez questão de quitar o valor dos materiais cedidos pelo senhor Nelson, mostrando sua integridade em meio à decepção. Apesar de todos os esforços e cultos realizados naquele templo, o sonho de ver a igreja florescer na região foi interrompido por barreiras humanas.

O desfecho, porém, trouxe reflexões profundas. Não muito tempo depois, o presidente da CADEESO foi destituído por envolvimento em adultério, e o pastor responsável pelo campo foi tragicamente assassinado em sua própria casa enquanto lia um jornal. Esses eventos trouxeram um senso de justiça divina, ainda que misturado com tristeza pelas vidas envolvidas. O templo em Nova Campo Grande tornou-se uma lembrança dolorosa, mas também um testemunho do esforço, da fé e do cuidado de Deus, mesmo em meio a adversidades e impedimentos.

O sonho das palmeiras não foi em vão. Ele nos ensinou que os caminhos de Deus muitas vezes encontram resistência, mas sua vontade sempre prevalece, de uma forma ou de outra. As mãos que trabalharam para construir aquele templo, as orações feitas ali, e os cultos realizados não foram esquecidos pelo céu. A lição mais importante permanece viva: mesmo quando os planos são frustrados aos olhos humanos, a fidelidade a Deus é o maior testemunho que podemos deixar.

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