O Salmo 23 e a Lição de Fé no Corredor do Hospital

O Salmo 23 e a Lição de Fé no Corredor do Hospital

Era quase meia-noite. Saímos do culto e fomos direto para o hospital. Minha mãe e eu. Não entendia muito bem o que estava acontecendo, mas já me acostumava a essa rotina que parecia maior do que eu. O hospital era um lugar frio, e o branco de suas paredes me dava medo. Caminhava nos braços de minha mãe, olhando ao redor para rostos cansados e olhares baixos, silêncios que ecoavam mais do que palavras. Não gostava daquele lugar onde todas as crianças pareciam doentes, onde eu era apenas mais uma entre tantas.

Apesar de tudo, havia algo que tornava a ida ao hospital suportável: a volta. Ao voltarmos para casa, minha mãe sempre me comprava algum doce. Era seu jeito de me confortar, de dizer que tudo ficaria bem. Um coração de mãe não resiste ao pedido de um filho doente, e, confesso, às vezes me aproveitava disso. Fora esse pequeno consolo, não havia nada no hospital que me agradasse.

Naquela noite, chegou a minha vez. Entramos na sala, e o médico foi direto:

— Mãe, ele vai ter que tirar o líquido da espinha urgentemente.

Não sabia o que aquilo significava, mas preferia acreditar que era melhor do que tomar mais uma injeção. Olhei para minha mãe, e vi sua expressão mudar. Sua preocupação ficou evidente, mas ela não hesitou em me carregar para o corredor, onde ficamos aguardando. Sentada em uma cadeira, com seus braços ao meu redor, minha mãe me abraçava como se quisesse proteger-me de tudo.

O barulho do hospital, antes feito de vozes e passos, foi se apagando. No corredor, parecia que o mundo havia se calado. O silêncio tomou conta do ambiente, deixando apenas a presença de minha mãe. Não havia palavras, apenas seu olhar, que transmitia algo muito maior do que conforto. Era amor, puro e inabalável.

Então ela falou, e eu fixei meus olhos em seus lábios, absorvendo cada palavra:

— Meu filho, repita o que a mamãe disser.
— Tá bem, mamãe — respondi.
— O Senhor.
— O Senhor.
— É o meu pastor.
— É o meu pastor.
— E nada me faltará.
— E nada me faltará.

Versículo por versículo, minha mãe recitou o Salmo 23 inteiro. Sua voz era firme, mas cheia de ternura. Suas palavras entraram em mim como uma âncora, algo que me segurava naquele momento de incerteza. Eu não apenas ouvi, mas gravei o salmo no coração. Nunca mais o esqueci.

Quando terminou, ela me abraçou com mais força. Foi como se, naquele gesto, ela transferisse sua fé para mim. E funcionou. Senti-me mais forte, mesmo que a fraqueza ainda tentasse me prender. Antes de eu entrar na sala, ela me disse:

— Meu filho, não tenha medo. Não poderei entrar com você, mas Jesus está contigo. Repita o versículo que te ensinei.

E assim, entre lágrimas e um amor que transcende palavras, ela me enviou para enfrentar o desconhecido. Entrei na sala. Havia muitas pessoas vestidas de branco, mas minha visão estava embaçada. Percebi uma seringa grande, com uma agulha que parecia terrível. Um dos médicos me deu uma ordem:

— Não se mexa.

E eu não me mexi. Fiquei imóvel, mas por dentro, minha alma orava. Repetia o Salmo 23 em silêncio, verso por verso, palavra por palavra. Sabia que minha mãe estava do lado de fora, intercedendo por mim, e essa certeza me deu coragem. Era como se a sua oração e a minha se unissem em um só propósito, criando uma força que eu não sabia que existia.

Quando saí da sala, estava diferente. Não sabia exatamente o que havia acontecido, mas o médico falou com minha mãe:
— Foi um sucesso.

Se era um sucesso, era algo bom. E o melhor de tudo foi voltar para os braços da minha mãe. Ela me segurava como se quisesse remendar não apenas meu corpo, mas minha alma. Médicos têm suas ferramentas e fazem o que podem, mas o amor de mãe é insubstituível. Ele não precisa de instrumentos; é um cuidado que vem do coração, que transcende o entendimento.

Aquele momento marcou minha vida. Uma pequena oração, recitada no silêncio de um corredor de hospital, mudou o curso de tudo. Minha mãe me ensinou, sem perceber, que a oração em meio à adversidade é um ato de fé. Ela é a manifestação de uma confiança inabalável em Deus, uma declaração de que Ele está presente, mesmo nos momentos mais difíceis.

Hoje, o Salmo 23 não é apenas um texto bíblico para mim. É uma lembrança viva de amor, fé e coragem. É a voz da minha mãe no silêncio, segurando-me nos braços e sussurrando palavras que me conectaram ao céu.

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