Acreditar no Impossível: A Fé que Desafia a Realidade

Há uma crença entre os religiosos, quase um axioma, que insiste: “Devemos acreditar no impossível.” Dizem isso com convicção, como uma verdade que ultrapassa a razão. Mas o que acontece quando nos deparamos com a necessidade de tornar essa crença em ação viva? Quando a fé deixa de ser um discurso leve e nos atinge com a força do que realmente desafia nossa capacidade de acreditar?

É uma tarefa fácil, quase trivial, falar de fé ao outro. Exortar alguém a confiar naquilo que não vê, a abraçar a ideia do impossível, é um exercício seguro quando estamos de fora. Sugerir ao próximo que tenha fé e que confie cegamente no que não pode ver — tudo isso nos vem sem esforço. Contudo, quando o impossível se aproxima de nós com sua face fria e densa, não mais um conceito, mas uma realidade, então nossas palavras titubeiam. Nossa fé, tão valente em teoria, começa a oscilar; o impossível, que um dia exaltamos, agora nos intimida e sussurra descrença ao coração.

É como se a crença passasse por uma espécie de metamorfose, transfigurando-se em dúvida, em angústia e, em última instância, em descrença. Quando o horizonte do possível recua, tornando-se uma miragem distante, começamos a construir uma fé ao avesso: passamos a acreditar apenas no que vemos e a duvidar do que é invisível. Nossos discursos sobre fé são esquecidos, e o impossível, antes celebrado, torna-se um absurdo inatingível. O que antes chamávamos de impossível, agora consideramos uma ilusão. Os milagres, que antes evocavam uma esperança inquebrantável, tornam-se símbolos opacos, incompreensíveis, e nos perguntamos se eram realmente divinos.

Há, no entanto, um abismo entre o que dizemos e o que realmente acreditamos. Pois é fácil manter a fé quando o impossível é uma ideia romântica, distante e sem ameaças. Mas quando o impossível se torna uma presença incômoda, que desafia nosso chão seguro, nossa mente começa a desfazer tudo aquilo que pregamos. É nesse ponto que muitos se afastam da fé; é aí que surge a desilusão com o divino, a mesma desilusão que repousa em tantos que se abrigam nas igrejas, feridos por uma promessa que nunca se concretizou. Quantas vezes fomos ensinados a acreditar em uma teoria bonita, porém frágil, uma fé que se dissolve ao menor toque do real?

Acreditar no impossível não é um exercício de autossugestão nem uma espera passiva. Não se trata de ver o milagre com os olhos da expectativa ingênua, mas de sustentar a esperança no silêncio, mesmo quando tudo parece contrário. Ter fé é perceber a morte tão próxima quanto a vida, é aceitar a presença da perda e, ainda assim, crer que a vida é mais vasta. A verdadeira fé no impossível é saber que a ausência de garantias é, em si mesma, uma abertura para o inesperado, para o que escapa ao nosso controle e compreensão.

Nos momentos mais áridos, a fé se revela um caminho de rendição, uma confiança que nos convida a soltar as rédeas do que queremos dominar. Quando o mundo nos empurra a um beco sem saída, é nesse ponto que a fé no impossível se torna o passo que desafia a lógica: é crer que um novo caminho se abrirá, que uma luz romperá o breu, que aquilo que parece final será apenas uma nova possibilidade.

A crença verdadeira não se define nas palavras que proferimos nem nas ações que nos esforçamos em demonstrar. Ela nasce e floresce na espera silenciosa, na paciência que se sustenta mesmo quando o mundo decreta o fim das esperanças. Aquele que crê no impossível é aquele que, em seu íntimo, conhece o ritmo lento e profundo da espera; que sabe que a fé é a linguagem do mistério, e que, no momento certo, o impossível se revela não como milagre, mas como continuidade, como vida que insiste e renasce.

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